sábado, 6 de novembro de 2010

Analfabetos funcionais e emprego

Hélio Consolaro*

Na coluna passada, abordamos tal tema sob a perspectiva da falta de compromisso da sociedade com a leitura. Depois que o jovem sai da escola, a sociedade não o incentiva a ler, pelo menos não facilita o acesso a jornais, revistas e livros.
O processo de alfabetização também cria analfabetos funcionais. Aliás, atualmente, não se fala mais em “alfabetização”, mas em “letramento”, não basta conhecer letras e números, precisa-se ler textos e, às vezes, longos.
Por que letramento? Ele é o resultado da ação de ensinar e aprender as práticas sociais de leitura e escrita. O estado ou condição que adquire um grupo social ou um indivíduo
como consequência de ter se apropriado da escrita e de suas práticas sociais.
Veja bem: ter se apropriado da escrita é diferente de ter aprendido a ler e a escrever: aprender a ler e escrever significa adquirir uma tecnologia, a de codificar em língua escrita e de decodificar a língua escrita; apropriar-se da escrita é tornar a escrita "própria", ou seja, é assumi-la como sua "propriedade". O letramento faz da pessoa uma leitora, tanto do mundo como dos signos, faz dela também uma escritora. Uma nova exigência do mercado de trabalho.
O presidente Lula veio do Nordeste, empregou-se na indústria automobilística paulista. Hoje, isso seria impossível, ele precisaria ter o ensino médio completo e saber rudimentos de inglês, porque o modo de fabricar os carros mudou, ficou mais complexo.
Até a década de 40, o Censo pedia ao cidadão brasileiro se ele sabia assinar o nome. Se respondesse que sim, era considerado alfabetizado. A partir de 1950, a pergunta era se o cidadão conseguia escrever um bilhete.
Na verdade, para o mercado de trabalho, alfabetizado (ou letrado) é a pessoa que revela habilidade para fazer uso adequado da leitura e da escrita: sabe ler e escrever, redige um ofício, preenche um formulário. Pensando assim, o grau de analfabetismo brasileiro cresce assustadoramente. Assim, ter freqüentado a escola por nove anos não garante o letramento.
Em termos de alfabetização, o método da silabação, adotada pelas antigas cartilhas, em que a criança era considerada alfabetizada no primeiro ano escolar, após um ditado aplicado pelo inspetor de ensino, garantiria o letramento tão necessário ao mercado de trabalho?
Conforme a realidade vai se tornando mais complexa, os velhos métodos se tornam obsoletos, viram apenas saudosismo. Atenderam a uma época, mas não funcionam mais.

*Hélio Consolaro é professor de Português, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras. 

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